29 de fevereiro de 2012

Marguerite Duras


'No mar, como no sono, não distingo o menino das outras crianças. Eu o vejo quando ela chega perto dele. Ela o põe nos ombros e assim avançam mar adentro como para morrer juntos, longe. Depois, na volta, ela o faz nadar perto dela, lentamente. Ei-los. saem do mar. Ele tem o corpo de um ugandês branco. É ela que enxuga seu corpo. Depois o deixa. Volta para o mar. Ele a olha. O sol agora saiu das colinas e inunda a praia, o mar, o menino. Ela ainda está andando, longe, com a mará baixa é preciso andar muito para chegar ao fundo. Ela chegou. Então, mergulha na água, se vira, manda um beijo na direção do menino e depois vai rumo ao alto mar, com a cabeça abaixada na água. Ele continua a olhá-la, imóvel. É fácil acompanhá-la com os olhos na superfície plana. Em torno dela o mar está esquecido pelo vento, abandonado por sua própria potência, tem a graça de quem está profundamente adormecido. O menino deitou-se. E eis que de novo o céu fica ligeiramente nublado, passagens de nuvens. Instala-se o hábito desse céu inconstante, dessa rota dos ventos que tangem as chuvas e os loesses até as fronteiras da China. Em torno do menino gira o mundo, esse dia inteiramente aqui contido em seus olhos. A jovem voltou, seu corpo agora está estendido perto do menino. Eles se calam com os olhos fechados, muito tempo.'


Marguerite Duras, em O Verão de 80.


Fonte: Revista 'Eaí?'


4 comentários:

myra disse...

Marguerite Duras é genial, nao escrevi aqui faz tempo, aliàs voce tbem nao:)))
mas vejo, so nao escrevo estive mal do braço, agora estou bem, e estas letrinhas detesto:(beijos
e saudades

Carmem Salazar disse...

Myra, também te vejo. É bom saber que estás bem.

beijos, querida.

Miguel Leocádio Araújo disse...

Coincidência: há pouco tempo comprei "O homem sentado no corredor/A doença da morte", também da Duras, numa edição linda da Cosac Naify. Estou saboreando os elixires dela.

Carmem Salazar disse...

Oi Miguel, tenho esse texto guardado há muito tempo. Agora, como ele reapareceu para mim, quis publicá-lo aqui e comecei a ler 'O Verão de 80'.

Um abraço.