29 de fevereiro de 2012

Marguerite Duras


'No mar, como no sono, não distingo o menino das outras crianças. Eu o vejo quando ela chega perto dele. Ela o põe nos ombros e assim avançam mar adentro como para morrer juntos, longe. Depois, na volta, ela o faz nadar perto dela, lentamente. Ei-los. saem do mar. Ele tem o corpo de um ugandês branco. É ela que enxuga seu corpo. Depois o deixa. Volta para o mar. Ele a olha. O sol agora saiu das colinas e inunda a praia, o mar, o menino. Ela ainda está andando, longe, com a mará baixa é preciso andar muito para chegar ao fundo. Ela chegou. Então, mergulha na água, se vira, manda um beijo na direção do menino e depois vai rumo ao alto mar, com a cabeça abaixada na água. Ele continua a olhá-la, imóvel. É fácil acompanhá-la com os olhos na superfície plana. Em torno dela o mar está esquecido pelo vento, abandonado por sua própria potência, tem a graça de quem está profundamente adormecido. O menino deitou-se. E eis que de novo o céu fica ligeiramente nublado, passagens de nuvens. Instala-se o hábito desse céu inconstante, dessa rota dos ventos que tangem as chuvas e os loesses até as fronteiras da China. Em torno do menino gira o mundo, esse dia inteiramente aqui contido em seus olhos. A jovem voltou, seu corpo agora está estendido perto do menino. Eles se calam com os olhos fechados, muito tempo.'


Marguerite Duras, em O Verão de 80.


Fonte: Revista 'Eaí?'